Na manhã da quinta-feira (21), a Câmara dos Deputados instaurou uma comissão de juristas negros que será responsável por revisar as leis de combate ao racismo no Brasil. O grupo já havia se reunido em 27 de novembro, após o assassinato de João Alberto Freitas, 40 anos, homem negro espancado até a morte por dois seguranças brancos de um Carrefour de Porto Alegre (RS). O colegiado será presidido pelo ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
De acordo com o presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), a intenção é tornar mais eficiente a legislação de combate ao racismo no Brasil até o dia 2 de fevereiro, quando ele deixará a presidência da Câmara.
“Estarei no plenário ajudando para que esse debate, que essa modernização, o avanço em uma legislação tão importante, um tema que o Brasil vem deixando de enfrentar há anos, ao lado do Damião (Feliciano) e outros deputados, terei a honra de votar muitas matérias”, afirmou.
Racismo no Brasil
Na abertura dos trabalhos do grupo nesta quinta, o ministro Benedito Gonçalves destacou a memória do racismo no país. “O Brasil foi o maior território escravagista do hemisfério ocidental por quase três séculos e meio. Recebeu, sozinho, quase 5 milhões de africanos cativos, 40% do total de 12,5 milhões traficados para a América.
Como resultado, ele recordou, o Brasil é o segundo país de maior população negra ou de origem africana do mundo. É também a nação que mais tempo resistiu a acabar com o tráfico negreiro e o último a abolir oficialmente o cativeiro na América do Sul”, disse, citando o racismo estrutural da sociedade brasileira.
“Chegamos no racismo estrutural. Menos perceptível, está cristalizado na cultura do povo de modo que, muitas vezes, nem parece racismo. A presença do racismo estrutural pode ser constatada pelas poucas pessoas negras que ocupam lugar em destaque nas instituições. Quando há utilização de expressões linguísticas em piadas racistas. Nossa missão é de levar a dignidade da pessoa humana, avaliando e propondo estratégias com vistas ao aperfeiçoamento dos atos normativos de combate ao racismo nas manifestações propostas”, completou.
Aliados no PSB na Comissão
Nas redes sociais, o deputado federal Bira do Pindaré (PSB-MA) comemorou a formação do colegiado, mencionando que o dia foi de “vitória para todos e todas nós que lutamos contra o racismo e por um país antirracista”.
Instituímos a Comissão que revisará as leis de combate ao racismo estrutural e institucional no Brasil. Dia de vitória para todos e todas nós que lutamos contra o racismo e por um país antirracista. Estou contente e agradecido de fazer parte dessa história. Axé!#EssaLutaéNossa pic.twitter.com/pFgB4WS4tl
— Bira do Pindaré (@BiradoPindare) January 21, 2021
Relator da comissão de juristas, o professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas, Silvio Luiz de Almeida, sintetizou o objetivo do grupo.
“A missão que tem no meu coração é honrar os meus ancestrais, é também salvar vidas e é também apontar um caminho, juntamente com os meus companheiros e as minhas companheiras que aqui estão pra que este país se torne um país melhor, um país mais justo, um país mais digno”, disse.
Estatuto da Igualdade Racial
Uma das leis que pode ser revista pela comissão de juristas é o Estatuto da Igualdade Racial. O grupo será assessorado por dois consultores legislativos da Câmara e poderá convocar acadêmicos e especialistas para participar das discussões.
Deputados da bancada negra vão propor que a comissão se torne uma estrutura permanente.
Voz
Para a secretária nacional da Negritude Socialista Brasileira (NSB), Valneide Nascimento, mesmo diante de uma crise econômica e sanitária como a que o Brasil tem vivido, este é o momento adequado para o debate e manutenção das leis antirracistas.
“Mesmo com pandemia, negros continuam sofrendo racismo, continuam sendo violentados e mortos. O vírus não escolhe cor ou identidade, mas a sociedade sim”, afirmou Valneide. Em entrevista ao Socialismo Criativo, ela também ressaltou a necessidade da participação da sociedade civil na discussão, reafirmando a importância de dar voz à população, que reivindica sua participação nos poderes.
Conhecimento
Logo no começo da reunião, a deputada Áurea Carolina (PSOL-MG) pontuou que soube da comissão pelas redes sociais, e que a reunião não foi devidamente publicizada entre os deputados da bancada de parlamentares negros e negras.
“A comissão é muito necessária. Tomei conhecimento da instalação da comissão nas redes. O que me causou profunda espécie, senhor Rodrigo Maia. Temos uma bancada que não é tão grande, de parlamentares negros e negras na Câmara, e é importante que essa bancada tome conhecimento de iniciativas que dizem respeito de uma agenda prioritária para nós”, reclamou.
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