Chegamos então ao início oficial da campanha eleitoral de 2022, faltando dois meses para o pleito, e se muita coisa mudou de 2018 para cá, algumas permanecem as mesmas, como por exemplo, a estupidez e truculência do bolsonarismo e também o romantismo de parte da militância progressista que, mais uma vez, pensa e faz política como se estivesse nos anos 1960/1970.
Tenho consciência que vou novamente mexer em um vespeiro e que é falta de bom senso meu, que tanto cobro isso dos outros, gastar munição e texto com pessoas bacanas e do meu espectro político, mas também acho necessário voltar ao tema até pela importância da eleição deste ano, quase um plebiscito entre democracia x fascismo. Daí a importância de se também coletivamente compreender o momento histórico e fazer uma militância de qualidade com foco para o que realmente interesse no momento: tirar o projeto fascista (representado por Bolsonaro e seu entorno) do poder.
Para isso também foi e é necessário compreender como ele conseguiu chegar ao poder. Ajudado, é certo, pelas circunstâncias, pela conjuntura mundial (até EUA com extrema-direita do poder), pelo lavajatismo, antipetismo, mídia tendenciosa. Mas também por um fator que é o que mais dá um nó na cabeça da esquerda: as fake news disseminadas e o uso sistemático e estratégico das redes sociais e Whatsapp pelo bolsonarismo.
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Uma tática que funcionou de maneira eficiente em 2018. E que se mantém em 2022, ajudada, paradoxalmente pela militância de esquerda. Explica-se: o conteúdo do bolsonarismo é amplamente divulgado pelos progressistas que continuam caindo nas armadilhas de Carluxo & cia.
Sei que há estudos sérios e com dados sobre isso, mas vou me ater ao empirismo de botequim. Parei ontem a noite em uma padaria e dei uma geral no conteúdo de vídeos e memes que recebi durante toda a segunda-feira, todos vindos de grupos e amigos de tendência assumidamente esquerdista. No total, contando os conteúdos repetidos, 38 de Bolsonaro, 12 de Lula e 4 de Ciro Gomes. Pois é. Os amigos e amigas de esquerda, na ânsia de se indignar e denunciar o genocida, compartilham o que ele faz, diz e pensa. Diariamente. Isso porque nem vou falar do conteúdo que liga Lula ao comunismo, que exalta Venezuela e Cuba e que tenta debater Marx e passar pano para Stalin.
Contudo, gente que entende de mídias sociais e algoritmos como Anitta, Felipe Neto e agora Janones insistem que essa “denúncia” do que o bolsonarismo faz é equivocada, afinal, só aumenta a presença dele e o chamado engajamento nas redes. Uma vez citada por Bolsonaro, Anitta o bloqueou e denunciou a armadilha: para Bolsonaro era bom política e midiaticamente ser atacado e debater com a cantora.
Nesta terça de manhã li a seguinte manchete no UOL: “Gagliasso sugere não compartilhar falas de Bolsonaro: ‘Imbecil quer chocar’, diz”. Exatamente isso. Cada frase racista, misógina, machista, homofóbica, tosca do miliciano, gera manchetes, comentários, interação e compartilhamentos, que chegam filtrados nas bolhas dele, como ele sendo a eterna vítima da mídia e do sistema.
As celebridades que vivem de redes sociais (e entendem delas, tanto que com elas ficaram milionárias) mostraram o mapa da mina: não compartilhar nem repassar conteúdo bolsonarista, que é o que eles desejam. A própria Anitta, assim como Janones, vem investindo em divulgar conteúdo de Lula, como a cantora fez em podcast, mostrando ao vivo áudio de Lula em vez de perder tempo criticando o “mito”. Resta agora a gente aqui na militância do dia a dia, parar de militar como nos anos 1960, como militavam nossos pais, em um tempo em que o homem acabara de chegar à lua, não existia internet e a comunicação era feita através de cartas manuscritas ou datilografadas. Esse tempo passou. É preciso entender a política – e a militância pelo zap e redes sociais – nos dias de hoje.
Por Cefas Carvalho, jornalista e colunista do Saiba Mais