Na última semana, o assassinato da jornalista palestina-americana Shireen Abu Akleh gerou revolta e comoção em todo o mundo. Abu Akleh era uma antiga correspondente da TV Al Jazeera Arabic e foi morta pelas forças israelenses na cidade de Jenin, no norte da Cisjordânia ocupada. E até durante o seu cortejo funébre, onde dezenas de palestinos prestavam a última homenagem a profissional, diversos militares do exército israelense ousaram atacar a população enlutada e não permitir a despedida da jornalista.
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Um dia depois, foi confirmada a morte da jornalista chilena Francisca Sandoval após ser baleada durante os atos do 1º de maio em Santiago. A repórter cobria os atos do Dia do Trabalhador e da Trabalhadora para o canal comunitário TV Sinal 3 da região de La Victoria, na capital chilena, quando levou um tiro na cabeça. Ela esteve internada durante 12 dias, em estado grave, passou por cirurgia, mas não resistiu aos ferimentos e faleceu na última quinta-feira (12).
Entre os dois casos fatais de ataque contra a vida de profissionais da comunicação, o jornalista Gabriel Luiz, da TV Globo, recebia alta no dia 6 de maio após sofrer dez facadas e permanecer internado durante 23 dias. Uma hipótese sob investigação é de que o repórter brasiliense sofreu o ataque após denunciar irregularidades em um clube de tiro na cidade de Brazlândia, região administrativa do Distrito Federal.
Os casos de Abu Akleh, Fracisca Sandoval, Gabriel Luiz completam a longa lista de ataques crescentes a profissionais de comunicação. De acordo com um relatório divulgado em fevereiro pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), a violência contra jornalistas bateu novo recorde em 2021. Desta vez, foram registrados 430 casos de agressões a jornalistas e veículos, dois a mais em relação ao ano anterior.
E se por um lado, alguns ‘atentam’ contra a nossa vida, no outro, querem tirar a nossa liberdade. A pesquisa aponta que a censura é, atualmente, o tipo de violência mais comum sofrido pelos jornalistas. Foram registradas 140 ocorrências, representando 32,56% do total de casos, enquanto a descredibilização da imprensa — que chegou a liderar a lista em levantamentos anteriores respondeu por 30,46% —, foram 131 ocorrências no total.
E mais uma vez, o presidente da República brasileira, Jair Bolsonaro (PL), lidera as ocorrências de crime contra os profissionais da área. Além de acusar a imprensa de praticar fake news, em todas as ocasiões em que suas mentiras, ações ou esquemas de corrupção de aliados foram revelados, Bolsonaro agrediu verbalmente os jornalistas, utilizando adjetivos como “canalha”, “quadrúpede”, “picaretas” e “idiota”, ou mandando “calar a boca” quando a pergunta lhe incomodou.
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Com um mandatário que não apenas incentiva, mas lidera a prática de violência contra os profissionais de comunicação, como pode o jornalismo “arranjar” forças para sobreviver em meio à ataques contra a vida de comunicólogos, a liberdade e a desinformação?
O jornalismo resiste
A resistência da imprensa livre está enraizada no seu papel democrático e fundamental na promoção, proteção e garantia de direitos humanos. Com o dever social de dar a voz à sociedade, a comunicação é a ferramenta que tem o poder de fomentar o debate público, agendar temas pertinentes as comunidades, acompanhar políticas públicas e fiscalizar o Estado.
Reafirmando sua relevância, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, fez referência ao Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, celebrado no último dia 3 de maio, e destacou o papel da comunicação na preservação dos valores democráticos.
“A imprensa livre é um dos pilares da nossa democracia e, por isso, em nome do Supremo Tribunal Federal, gostaria de cumprimentar o trabalho desenvolvido por todos os setoristas do STF, jornalistas de todo o Brasil, cinegrafistas, fotógrafos, editores, redatores, todos aqueles que diariamente ajudam na produção e divulgação de notícias e que se prestam a informar a nossa sociedade, propiciando sua autodeterminação, suas escolhas e juízo de valor”, disse Fux.
A ministra Cármen Lúcia endossou a fala do presidente da Corte e destacou que o direito a informação está expresso na lei. “Não há democracia sem imprensa livre. Acho que é algo bem simples de ser entendido. O direito à informação é previsto no inciso 33 do artigo 5º da Constituição”, afirma.
Cármen também ressaltou a importância do jornalismo no combate a desinformação. “É a imprensa que consegue desfazer [fake news], esclarecer, informar, para que a gente tenha uma democracia com os padrões de qualidade humana, dignidade humana que se pretende. Por isso, faço esse realce”, concluiu a magistrada.
Em suma: o direito a informação é intrínseco a constituição de uma sociedade, entrelaçados pela garantia à democracia e a justiça social. E enquanto uma nação resistir aos ataques autoritários de um governo tirano que atenta contra a existência e liberdade do povo, o jornalismo e a imprensa livre também irão resistir.