
O caso de obstrução de juíza ao aborto de uma menina de 11 anos, vítima de estupro, reacendeu o debate sobre o tema no Brasil. Enquanto a legislação pró-aborto não avança há 10 anos, o governo de Jair Bolsonaro (PL) quer propor novas barreiras no acesso ao aborto legal.
Nesta semana, o secretário de Atenção Primária do Ministério da Saúde, Raphael Câmara, convocou uma audiência pública para a próxima semana com o objetivo de discutir uma nova cartilha com novas orientações sobre o aborto legal.
O G1 já havia antecipado a intenção do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, de debater sobre uma cartilha que ignora o estatuto legal da interrupção da gravidez no país.
No Brasil, o procedimento não é considerado crime, pela lei, em três situações: estupro, risco de vida à mãe e, desde 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a interrupção da gravidez é permitida para casos em que há má formação do cérebro em fetos.
O secretário do ministério, bolsonarista antiaborto, quer restringir no guia o acesso ao direito da mulher, ao estabelecer, por exemplo, o que seria o “rol de doenças que representam risco de vida para a mãe”, além de praticamente querer comprovar, com uma investigação policial, que a mulher foi estuprada antes de conceder seu direito a interromper à gestão.
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Outro ponto é a desculpa do governo de querer discutir a “epidemiologia do aborto”: quais são, segundo o ministério, as principais causas de abortamento para tratar a causa.
Governo quer intimidar vítimas de estupro
No caso de estupro, as novas regras visam intimidar ainda mais as vítimas. Além da portaria de 2020, que orienta hospitais a avisarem autoridades policiais sobre o estupro — o que não prevê a lei —, a discussão interna para a nova cartilha no ministério ainda coloca em dúvida a palavra da mulher sobre o abuso, segundo o G1.
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Por exemplo, o novo guia quer endurecer o procedimento para quando receber uma vítima de estupro, na prática, priorizando a investigação policial ao atendimento imediato, ao acolhimento à mulher violentada.
Marcelo Queiroga disse que o governo não mexerá em questões previstas em lei, que isso não é é uma questão de saúde. Contudo, que o secretário Câmara quer debater os critérios do aborto legal para, por exemplo, orientar hospitais.
Além disso, Queiroga admite que o MS pretende colocar em debate “o que é o risco à saúde da mãe”, no aborto legal. “Por exemplo, podemos debater um rol de doenças. Se o médico sair do rol, ele vai ter de justificar o motivo para não ser punido”.
Para especialistas, essa eventual mudança vai ser mais uma barreira e intimidação ao trabalho médico, para cumprir a lei.
Suprema Corte dos EUA derruba decisão que garante direito a aborto
Em decisão arcaica e conservadora, a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubar o direito constitucional que garantia aborto legal no país nesta sexta-feira (24).
Por seis votos contra três, os juízes derrubaram a chamada Roe contra Wade, uma decisão histórica da própria Suprema Corte da década de 1970 que estabeleceu o direito ao aborto nos Estados Unidos. A decisão, já adiantada por um rascuho vazado em maio, representa uma vitória para o partido Republicano e as alas conservadoras e religiosas do país, que queriam proibir a interrupção legal da gravidez.
O novo julgamento do Supremo, no entanto, não significa que o aborto está automaticamente proibido nos Estados Unidos, embora deva tornar a interrupção da gravidez ilegal em quase a metade dos estados do país.
Se esse direito for suprimido, os Estados Unidos regressariam à situação anterior a 1973, quando cada estado era livre para proibir ou autorizar o aborto.