Com o intuito de enfraquecer a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia que vai analisar as ações do governo no enfrentamento à crise da Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem defendido a ampliação da investigação. Ele quer que a atuação de governadores e prefeitos também seja avaliada pelo colegiado. Além de pressionar um senador da República para acatar pedidos de impeachment contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
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Neste sábado (10), o presidente telefonou para o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) e pressionou o parlamentar a ingressar com pedidos de impeachment contra ministros da Suprema Corte. Em conversa por telefone divulgada pelo próprio senador em suas redes sociais, Bolsonaro dá a entender que, se houver pedidos de impeachment contra ministros da Corte, podem ocorrer mudanças nos rumos sobre a instalação da CPI da Pandemia.
“Você tem de fazer do limão uma limonada. Tem de peticionar o Supremo para colocar em pauta o impeachment (de ministros) também”, disse Bolsonaro a Kajuru. “Sabe o que eu acho que vai acontecer, eles vão recuperar tudo. Não tem CPI… não tem investigação de ninguém do Supremo”, continuou o presidente. O senador respondeu que já havia entrado com pedido de afastamento do ministro Alexandre de Moraes.
Críticas à conspiração contra CPI da Pandemia
Lideranças políticas têm criticado as declarações do presidente contra o STF e o ministro Barroso e os ataques à CPI da Pandemia.
O líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), considera o diálogo entre o presidente e o senador “escandalosa”. O socialista comentou o fato pelas redes sociais na manhã desta segunda-feira (12).
O líder da Minoria na Câmara, Marcelo Freixo (Psol-RJ) considera o diálogo entre Bolsonaro e Kajuru uma confissão de crimes do presidente na pandemia e mais um motivo para o impechment.
O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), ex-presidente da Câmara, também se manifestou contrário ao presidente. Ele considera a conversa entre um senador e o presidente da República para articular contra uma CPI e um ministro do STF um fato gravíssimo.
O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), afirmou que o episódio em que o presidente da República trama perseguição ao ministro do STF é “mais uma vergonha”. Ele classifica Bolsonaro como o “sujeito mais despreparado que já ocupou a presidência da história do Brasil”.
Pressão para retirada de assinaturas
A estratégia de Bolsonaro tem por objetivo pressionar os parlamentares a retirem assinaturas favoráveis ao pedido de CPI da Pandemia. Para o governo, a ampliação do escopo da comissão para incluir investigação a governadores e prefeitos poderia reduzir o apoio dos senadores, já que eles são ligados politicamente a governos e prefeituras. O Planalto tem pouco tempo para atuar, pois os procedimentos para a instalação da CPI devem começar nesta semana.
Para defender a ampliação da CPI da Pandemia, Bolsonaro disse que enviou recursos aos governos de estado e municípios, mas que as administrações regionais não investiram em hospitais e postos de saúde.
Senadores favoráveis à CPI da Pandemia dizem que as declarações do presidente não devem ser suficientes para impedir a abertura da comissão. Eles argumentam que a solicitação já é ampla o bastante e que as investigações certamente incluiriam o uso de recursos federais pelos governos de estados e municípios.
Impeachment contra ministros do STF
Atualmente, há dez pedidos de impeachment contra ministros do STF no Senado, sendo seis apenas contra Moraes. Também há requerimentos para investigar Gilmar Mendes, Edson Fachin e Cármen Lúcia. O senador Carlos Viana, vice-líder do governo, tenta coletar assinaturas para uma CPI que apure a interferência entre os Poderes para encaminhar um pedido de afastamento contra o ministro Luís Roberto Barroso, autor do pedido de comissão da Pandemia.
Na próxima quarta-feira (14), o plenário do STF vai analisar a liminar de Barroso pedindo a instalação da CPI da Pandemia. Um ministro ouvido pelo jornal Estadão disse que a instalação da comissão se daria apenas quando os trabalhos voltarem a ser presenciais.
A conversa do presidente com Kajuru, porém, poderia interferir para acelerar o início da investigação. Para o ministro ouvido pelo jornal, se ficar caracterizado que Bolsonaro quis intimidar o STF, não haverá adiamento da instalação da CPI.
A ideia de adiar a CPI para quando voltarem as sessões presenciais no Senado é defendida também por muitos parlamentares. Eles argumentam que a comissão poderia não funcionar efetivamente caso a comissão tenha de atuar de forma remota.
As reuniões aconteceriam em salas fechadas, com menor circulação de ar. Sem as mínimas garantias sanitárias, os depoimentos teriam de ser colhidos à distância, o que impossibilitaria a análise de documentos sigilosos. Mesmo com sessões presenciais, testemunhas poderia alegar motivos médicos para não comparecer.
Interferência na CPI da Pandemia
Bolsonaro quer interferir na escolha dos integrantes da CPI da Pandemia para garantir que tenha parlamentares favoráveis a ele na investigação. Pelas contas dos líderes dos partidos, a oposição tem hoje 5 das 11 cadeiras, enquanto o presidente tem 4 aliados.
Os nomes restantes devem vir do bloco formado pelo PSDB e pelo Podemos, que têm em seus quadros apoiadores e opositores ao governo. De acordo com quem for escolhido, a comissão pode ser mais favorável ou contrário a Bolsonaro.
As centrais sindicais CUT, Força Sindical, UGT, CTB, NCST e CSB declararam que defendem a imediata instalação da CPI da Covid. “Há responsabilidades do governo federal a serem apuradas com as quase 350 mil mortes que o país tragicamente acumula, situação que confere ao Brasil a vergonhosa denúncia internacional de péssima condução no enfrentamento da crise sanitária. Manifestamos nossa solidariedade ao Supremo Tribunal Federal e ao Ministro Luís Roberto Barroso que determinou a instalação da CPI da Covid”, declarou a CUT em seu site.
Com informações do Estadão