O impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já é desejado por 54% dos brasileiros, segundo a última pesquisa realizada pelo Datafolha. Desde que o instituto começou a apurar o tema, essa é a primeira vez que a maioria dos entrevistados é a favor do impedimento do presidente. Apenas 42% da população brasileira é contra.
Foram ouvidos de forma presencial 2.074 maiores de 16 anos, em todo o país, nos dias 7 e 8 de julho. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou menos.
A última rodada foi realizada nos dias 11 e 12 de maio e os favoráveis ao impeachment já tinham um empate técnico entre 49% a 46%.
O resultado da pesquisa reflete as crises política, econômica e sanitária que o Brasil está assolado, que são ainda mais agravadas pelos escândalos de corrupção envolvendo a compra de vacinas pelo governo federal.
Impeachment Já!
O líder da Oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), usou as redes sociais para repercutir a pesquisa e ressaltou que ele é um pedido dos brasileiros.
Já o líder do PSB na Câmara, Danilo Cabral (PSB-PE), usou da ironia e citou a música ‘Anunciação, do cantor Alceu Valença, para comentar os dados do Datafolha.
Superpedido de impeachment
O PSB, juntamente com os demais partidos de oposição, encaminhou, no dia 30 de junho, um “superpedido” de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro, na Câmara dos Deputados. Ao menos 23 condutas criminosas cometidas pelo presidente Jair Bolsonaro desde o início do mandato são citadas no documento.
O Superpedido reúne os outros 120 pedidos de impedimento já feitos na Casa, conta com 46 assinaturas, 271 páginas e foi elaborado pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), com apoio de partidos de Oposição e de diferentes campos políticos, entidades representativas da sociedade e personalidades, signatários do documento.
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Molon, representando o PSB, afirmou que este é o maior pedido de impedimento já protocolado. “É o mais amplo, tanto pela enumeração de crimes praticados pelo presidente da República, dos mais antigos aos mais recentes, quanto pelo hall de signatários, das mais diversas posições políticas”, disse em entrevista na ocasião.
Motivos não faltam
A lista de motivos para abertura de um pedido de impeachment contra o Bolsonaro é extensa. Foram descobertas suspeitas de negociações obscuras de vacinas inexistentes, cobrança de propina, prevaricação entre outros.
O documento aponta que os crimes do presidente vão desde ameaças ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF), até apoio e a participação em manifestação antidemocrática. Veja quais são:
– Crime contra a existência política da União. Ato: fomento ao conflito com outras nações;
– Hostilidade contra nação estrangeira. Ato: declarações xenofóbicas a médicos de Cuba;
– Crime contra o livre exercício dos Poderes. Ato: ameaças ao Congresso e STF, e interferência na PF;
– Tentar dissolver ou impedir o funcionamento do Congresso. Ato: declarações do presidente e participação em manifestações antidemocráticas;
– Ameaça contra algum representante da nação para coagi-lo. Ato: disse de que teria que “sair na porrada” com senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), membro da CPI da Covid;
– Opor-se ao livre exercício do Poder Judiciário. Ato: interferência na PF;
– Ameaça para constranger juiz. Ato: ataques ao Supremo;
– Crime contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais. Ato: omissões e erros no combate à pandemia;
– Usar autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder. Ato: trocas nas Forças Armadas e interferência na PF;
– Subverter ou tentar subverter a ordem política e social. Ato: ameaça a instituições;
– Incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina. Ato: ir a manifestação a favor da intervenção militar;
– Provocar animosidade nas classes armadas. Ato: aliados incitaram motim no caso do policial morto por outros policiais em Salvador;
– Violar direitos sociais assegurados na Constituição. Ato: omissões e erros no combate à pandemia;
– Crime contra a segurança interna do país. Ato: omissões e erros no combate à pandemia;
– Decretar o estado de sítio não havendo comoção interna grave. Ato: comparou as medidas de governadores com um estado de sítio;
– Permitir a infração de lei federal de ordem pública. Ato: promover revolta contra o isolamento social na pandemia;
– Crime contra a probidade na administração. Ato: gestão da pandemia e ataques ao processo eleitoral;
– Expedir ordens de forma contrária à Constituição. Ato: trocas nas Forças Armadas;
– Proceder de modo incompatível com o decoro do cargo. Ato: mentiras para obter vantagem política;
– Crime de apologia à tortura;
– Negligenciar a conservação do patrimônio nacional. Ato: gestão financeira na pandemia e atrasos no atendimento das demandas dos estados e municípios na crise de saúde;
– Crime contra o cumprimento das decisões judiciais. Ato: não criar um plano de proteção a indígenas na pandemia.
Lira não deixa
Entretanto, o presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP-AL) é aliado de Bolsonaro e o único capaz de levar adiante o pedido de impedimento.
Em entrevista à CNN Brasil neste sábado (10), Lira voltou a indicar que não pretende, por ora, dar sequência a algum dos mais de 100 pedidos de impeachment de Bolsonaro. E aproveitou para defender a discussão do semipresidencialismo, para valer a partir de 2026.
“Não é o presidente da Câmara que faz o impeachment, é o impeachment que faz o presidente da Câmara. Precisa de muitas características, critérios, consequências juntas que possam unir para chegar nessa situação.”
“O Brasil não deve se acostumar o tempo todo em estar instabilizado eleição após eleição, todos os presidentes que passaram e foram eleitos desde a redemocratização tiveram pedidos impeachment, votados, uns aprovados, outros rejeitados”, afirmou.
Pressão popular para o impeachment
Líderes centristas discutem o reflexo das pesquisas e admitem que o impeachment pode acontecer se houver povo na rua, pressionando o Congresso.
Defendem mais o impeachment mulheres (59%), jovens (61%), mais pobres (60%, no grupo mais volumoso da estratificação econômica da pesquisa, 57% da amostra) e moradores do Nordeste (64%). Esses dados seguem a linha das outras abordagens feitas pelo Datafolha sobre Bolsonaro.
Valores ainda mais altos de aprovação ao processo são encontrados entre os que se declaram pretos (65%) e homossexuais ou bissexuais (77%).
Apoio ao presidente
Já o apoio ao presidente se mostra maior entre mais velhos (49% de rejeição a processo), entre os evangélicos (56%), quem ganha de 5 a 10 salários mínimos (62%), mais ricos (59%) e os empresários (68%, mas um grupo com apenas 2% da amostra).
Regionalmente, a história de outros ângulos da pesquisa se repete. Bolsonaro vê a rejeição ao impedimento ganhar por 52% a 46% no Norte/Centro-Oeste e registra um empate no Sul, com 49% para cada lado —as duas áreas são as mais bolsonaristas do país.
Impeachments anteriores
No Brasil, os dois presidentes que sofreram impeachment desde a redemocratização de 1985 tinham patamares mais altos de aprovação ao processo.
Segundo reportagem da Folha, Fernando Collor (então no PRN) viu 75% da população pedir sua cabeça às vésperas da abertura dos procedimentos na Câmara, em setembro de 1992 —ele viria a renunciar após ser afastado para julgamento.
Já Dilma Rousseff (PT) teve de 63% a 68% de apoio a seu impeachment em três aferições feitas pelo Datafolha. Ela acabou afastada em 2016, dando lugar ao vice, Michel Temer (MDB).
Abatido por crise política, Temer viu o pedido por seu impedimento ser feito por 81% dos entrevistados em junho de 2017. Mas sua força congressual e ausência de movimento forte nas ruas, como ele mesmo disse, garantiram sua sobrevivência no cargo.
Com informações da Folha de S. Paulo