
A Polícia Federal (PF) encontrou na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, uma minuta de um decreto para instaurar estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e mudar o resultado das eleições de 2022.
Segundo juristas, a medida é inconstitucional e configuraria um golpe de Estado com o objetivo de invalidar a vitória legítima de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre Bolsonaro na última eleição.
Para entender melhor a investida golpista da gestão Bolsonaro, o Socialismo Criativo explica os detalhes e o porque da tentativa, caso fosse continuada, seria uma ameaça ao Estado Democratico de Direito.
O que a minuta golpista prevê?
O texto decreta um estado de defesa “com vistas a restabelecer a ordem e a paz institucional, a ser aplicado no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, para apuração de suspeição, abuso de poder e medidas inconstitucionais e legais levadas a efeito pela Presidência e membros do Tribunal, verificados através de fatos ocorridos antes, durante e após o processo eleitoral presidencial de 2022”.
O que é “estado de defesa”?
A Constituição Federal prevê que o presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, “decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”.
O ato sobre o estado de defesa tem de ser enviado ao Congresso em 24 horas e ser submetido à aprovação por maioria absoluta.
E por que é inconstitucional e golpista?
Especialistas ouvidos pelo Jornal Nacional afirmam que o documento é inconstitucional por prever a interferência indevida do Poder Executivo na Justiça Eleitoral.
“Segundo a legislação brasileira, o crime é realizado não apenas quando um golpe de Estado é efetivamente bem-sucedido ou realizado. O legislador brasileiro criminaliza a mera tentativa de abolição da democracia, desde que haja uma grave ameaça associada a essa tentativa, e esse documento pode eventualmente ser considerado como uma própria exteriorização ou uma materialização de uma grave ameaça ao funcionamento dos poderes instituídos”, explica o constitucionalista Ademar Borges.
Mas por que o documento é prova de uma tentativa de golpe?
Segundo especialista ouvido pelo jornal G1, o “propósito” do decreto “seria interferir no Tribunal Superior Eleitoral para Bolsonaro se autodeclarar vencedor das eleições”. “É golpe. Não existe uma previsão legal para isso. Não existe no estado democrático de direito. É um ato preparatório de crime. Se fosse colocado em prática, levaria à prisão de Anderson Torres e do próprio Jair Bolsonaro”, afirmou Renato Ribeiro de Almeida, coordenador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).
Qual a responsabilidade de Bolsonaro?
O estado de defesa é um decreto que só pode ser assinado pelo Presidente da República. Com isso, juristas defendem que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) também deve ser investigado.
O caso preocupa aliados próximos de Bolsonaro, segundo apuração do blog do Camarotti. O grupo teme um depoimento comprometedor de Anderson Torres e até mesmo uma eventual delação premiada.
“A existência da minuta indica que Bolsonaro pensou no assunto. E Anderson Torres terá que responder quem escreveu a minuta. Bolsonaro teve participação? O incômodo no partido é muito forte, porque o PL não quer confusão. O PL é da política”, disse um influente integrante do PL ao blog.
Investigadores da PF e membros da equipe de Lula avaliam que a minuta é a 1ª prova de que o governo Bolsonaro cogitou um golpe, segundo apurou o blog do Valdo Cruz. Para eles, o documento complica a situação do ex-presidente.
“É um elo da corrente golpista”, classificou o ministro da Justiça, Flavio Dino. “É gravíssimo e é a materialidade que mostra o real objetivo dos eventos do dia 8 de janeiro”, disse o ministro da Advocacia Geral da União, Jorge Messias.
Na última live do mandato, Bolsonaro afirmou ter buscado “dentro das quatro linhas da Constituição”, uma forma de questionar o resultado das eleições. Segundo ele, não teve apoio para isso, e por isso não conseguiu levar a ideia adiante.
“Mesmo dentro das quatro linhas temos que ter apoios. Alguém acha que é pegar uma caneta BIC e assinar?”, questionou o presidente. “Agora, certas medidas têm que ter apoio do parlamento, de alguns do Supremo, de outros órgãos, de outras instituições”.