Em março, quando entrou em vigor o estado de calamidade pública no Brasil, pouco se sabia sobre os possíveis impactos da pandemia do novo coronavírus na economia do país, vindos do setor criativo e cultural. Após quase seis meses de crise, uma pesquisa indica que entre trabalhadores da área, 52% se mantinham exclusivamente com renda vinda de atividades exercidas eles no setor cultural, paralisado no início da crise.
O dado é da Pesquisa Impactos da Covid-19 para a Economia Criativa, liderada pelo Observatório da Economia Criativa da Bahia (OBEC-BA), da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O relatório foi apresentado nessa terça-feira (18), em live realizada pelo Programa Sesc Ideias.
Em relação à capacidade de manutenção da renda, a pesquisa mostra que 71% dos indivíduos e 77% das organizações declararam que caso de suspensão total das atividades, o que ocorreu em março, só teriam recursos para se manter por até 3 meses.
Outro dado alarmante foi a precariedade tanto nas condições de trabalho, como na remuneração. O documento aponta que existem pessoas trabalhando 45 horas semanais e ganhando uma média de 2 salários mínimos.
O cantor e compositor Gilberto Gil, que foi ministro da Cultura no governo da ex-presidenta Dilma Roussef, acompanhou a divulgação dos dados. Para Gil, a pesquisa ajuda a refinar o olhar sobre o setor, porque “acumula, organiza e distribui uma série de dados importantíssimo dos vários setores criativos da vida cultural brasileira”.
“Essa pesquisa traz um panorama muito importante sobre o papel das artes, dos conhecimentos tradicionais e das formas identitárias na formação da cultura brasileira”, lembrou.
Negócios mais afetados
A crise pegou em cheio os setores culturais e criativos devido à necessidade de evitar aglomerações e manter o isolamento social, para prevenir a contaminação pela doença. Em outro recorte, atividades como cursos, shows, festivais, aulas, peças teatrais e oficinas estão entre os negócios mais afetados durante a quarentena, com 65,8% de redução de contratos e 50,2% de demissões de colaboradores.
Só em abril, segundo o levantamento 78% dos agentes (Individuais e organizações) chegaram a cancelar entre 50% e 100% das atividades que compõem a cadeia produtiva da cultura (consumo, criação, produção, fruição, distribuição).
Pesquisa e Planejamento
De acordo com Daniele Canedo, gestora cultural e professora da UFBA – que apresentou a pesquisa-, a situação da crise também agravou a capacidade de planejamento, já observada no setor criativo e cultural antes mesmo da pandemia. Contudo, Canedo disse haver perspectivas promissoras.
“Apesar dos cancelamentos de atividades, o setor criativo não ficou paralisado. Isso porque tanto os indivíduos, quanto as organizações estão desenvolvendo novos projetos e produtos, com percentual de 50% indicando essa tendência”, destacou ela.
A adoção de estratégias digitais de relacionamento com o público e venda de produtos foram apontadas por mais de 50% dos entrevistados como necessárias para se adequar aos novos tempos. A importância da capacitação digital foi mencionada por ¼ dos respondentes.
A sustentabilidade financeira, o fortalecimento da gestão cultural e o aprimoramento da atuação profissional, além da pesquisa e formação continuada aparecem como as principais medidas de melhorias sugeridas pelo setor.
Importância econômica da cultura
Vice-Reitor da UFBA, Paulo Miguez, falou da importância do setor cultural para economia do país, usando como exemplo os Estados Unidos. Lá, são investidos US$ 2.2 trilhões de dólares no setor cultural. De acordo com ele, o valor é superior 9,5% do PIB brasileiro.
“Quando nós não consideramos as possibilidades da dimensão socioeconômicas da cultura, que vai dos mercados da propriedade intelectual, dos mercados das indústrias culturais às nanoeconomias e aos nanomercados das culturas populares nós deixamos de fora uma potência do ponto de vista econômico”, disse ele.
O levantamento dedicado à percepção dos impactos da pandemia nos setores criativo e cultural brasileiros, entrevistou 1.900 pessoas, a partir de questionários virtuais específicos para indivíduos e organizações. O estudo foi realizado por meio de uma rede de colaboração acadêmica, que contou com contribuições de pesquisadores de outras universidades públicas.
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