Não é novidade que a pandemia do novo coronavírus realçou desigualdades sociais, como, por exemplo, em relação à falta de acesso à saneamento básico. Desta vez, uma pesquisa mostra que o trabalho remoto também acentua as desigualdades, revelando a exclusão digital enfrentada por cerca de 26% da população.
Além disso, a situação é agravada pela incipiente cultura de trabalho remoto entre os brasileiros. A investigação é resultado de estudo realizado pela Rede de Pesquisa Solidária, que reúne pesquisadores de instituições como a USP e o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento).
A análise aponta que, antes da pandemia, a cultura do trabalho em casa fazia parte da vida de apenas 5% da população, indica o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em sua maioria, eram autônomos, sem vínculo formal e de baixa renda, como vendedores, costureiras e manicures, reporta a Folha.
O trabalho remoto levou 10% dos ocupados a exercer suas atividades em casa, mas esse acréscimo incidiu sobre trabalhadores com perfil de maior grau de escolaridade e renda mais alta.
Profissões como a de professor e profissionais liberais passaram a trabalhar remotamente, aproveitando facilidades no acesso à internet que já tinham. Essa vantagem, porém, não refletiu na rotina laboral de trabalhadores mais pobres.
Sem internet ou com conexão limitada, muitos não foram incluídos na nova modalidade e, inclusive, não puderam se adaptar às mudanças causadas pela crise.
“Com o impacto da crise na renda das famílias, é provável que muitas tenham deixado de pagar e perdido a conexão, o que acentua desigualdades”, afirma Fábio Senne, do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC. br), ligado ao CGI.
Desigualdades e acesso a internet
Quando a Covid-19 ainda não afetada a população brasileira, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI) concluiu uma pesquisa sobre usuários da internet no Brasil identificou que 74% da população tem acesso à rede. Contudo, poucos usavam a internet para trabalhar. A maioria navega pelo celular, especialmente em redes sociais.
“A falta de conexão com a tecnologia limita o acesso de muitas pessoas às formas de trabalho remoto que ganharam impulso na pandemia, especialmente as mais pobres”, pontua Senne, que também integra a Rede de Pesquisa Solidária.
Segundo dados do IBGE analisados Rede de Pesquisa Solidária, 26% dos gerentes e diretores de empresas passaram a trabalhar em casa com a pandemia, assim como 17% dos profissionais de apoio administrativo e 14% dos técnicos de nível médio.
Menos de 5% dos membros desses segmentos da força de trabalho exerciam suas atividades remota mente antes da pandemia, segundo o IBGE. Em outras áreas, ocorreu o inverso. Entre os trabalhadores do comércio e dos serviços, 8% trabalhavam em casa e só 3% passaram a fazê-lo.
“Mesmo entre os que venceram a principal barreira e estão conectados à internet, o uso para atividades de trabalho é muito baixo”, diz Senne.
Mesmo com a reabertura da economia na maioria dos estados, a volta ao trabalho tende a ser lenta, dizem os pesquisadores.
A Rede de Pesquisa Solidária reúne pesquisadores de instituições como a USP e o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). Os trabalhos estão disponíveis no site do grupo.
Com informações da Folha.