
Estudantes e professores fazem manifestação contra o contingenciamento despesas na educação em Brasília (DF) / Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A Educação é a base para o desenvolvimento sustentável e para que a economia criativa impulsione a construção de novos paradigmas para a era digital. Há cinco anos entrou em vigência o Plano Nacional de Educação, que estabelece diretrizes, metas e estratégias para a política educacional até 2024. Metade do caminho foi percorrido, mas desde o primeiro dia deste ano de 2019, a Educação brasileira caminha de ré, a passos largos rumo ao retrocesso, com uma gestão marcada por polêmicas vazias e perseguição ideológica, que até o momento não entregou nenhuma contribuição positiva para que a educação brasileira avance ao longo desta década. Ao contrário, as pautas do Ministério da Educação giram em torno de declarações desconexas, performances teatrais e cortes (ou contingenciamento, tanto faz) de verbas na área, da educação infantil ao ensino superior.
O presidente do Instituto Pensar, Domingos Leonelli, avalia que a Educação é o pilar básico e mais urgente da economia criativa. Na verdade, para alguns socialistas brasileiros, comenta, é necessário uma verdadeira revolução na Educação brasileira, que começaria pelo Ensino Fundamental. A programação computacional, a formação diversificada e o empreendedorismo deveriam constar de um projeto verdadeiramente revolucionário para a Educação.
“O que se vê no governo Bolsonaro é um terrível retrocesso nos modestos avanços que já se verificaram na Educação brasileira. Uma prova disso é o escanteamento do Plano Nacional de Educação.”
Domingos Leonelli
Instituto Pensar
O PNE foi aprovado após intenso debate no Congresso Nacional para reger iniciativas federais, estaduais e municipais no campo da educação para ampliar oportunidades educacionais, reduzir desigualdades, valorizar a diversidade e os profissionais da área. Instituído pela Lei Nº 13.005/2014, estabeleceu dez diretrizes, como a erradicação do analfabetismo e a universalização do atendimento escolar. O texto também prevê a conclusão de 20 metas educacionais ao longo de uma década.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) divulgada no dia 19 de junho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que 30,7% dos jovens brasileiros de 15 a 17 anos estão atrasados ou fora da escola. O desprezo pelo PNE e a falta de políticas públicas explicam os resultados negativos da pesquisa, que mostra que a educação do país ainda está longe da resolução de seus principais problemas. A Pnad Contínua, que abrange 211 mil domicílios em todo o país, revela que ainda há 11,3 milhões de analfabetos no país. O índice passou de 6,9% da população acima de 15 anos, em 2017, para 6,8% desse grupo em 2018. Revela que há altos índices de jovens de 15 a 29 anos que não estudam e nem trabalham (23%); e que 40% da população acima de 25 anos não têm nem o ensino fundamental completo.
Em maio, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação fez um levantamento que revelou que apenas quatro das 20 metas haviam sido parcialmente cumpridas nos últimos cinco anos. O levantamento projetou que caso o contingenciamento de recursos para a área seja mantido, o PNE chegará ao último ano de vigência com cerca de 90% das metas descumpridas. Segundo esse balanço, a Emenda Constitucional 95, que definiu um teto de gastos públicos por 20 anos, é uma das grandes ameaças ao Plano.
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) é outro ponto importante para alcançar as metas educacionais. O modelo em vigor desde 2007 até 2020 subsidia mais de 40 milhões de matrículas de redes estaduais e municipais, por meio de R$ 156,4 bilhões. Embora seja um avanço em relação ao sistema anterior – o antigo Fundef (1998-2006), restrito ao ensino fundamental –, o atual Fundeb não tem sido capaz de universalizar a educação básica obrigatória (para a população de 4 a 17 anos), zerar a demanda manifesta de matrículas em creches (para a população de 0 a 3 anos), alicerçar a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e garantir um padrão mínimo de qualidade para todas as matrículas ofertadas nas escolas públicas.
Nesse contexto, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação defende, em nota, a aprovação da PEC 15/2015. A matéria estabelece um novo Fundeb, que deverá ser permanente, ter a capacidade de criar matrículas e universalizar um padrão de qualidade capaz de garantir o processo de ensino-aprendizagem. Apresentada em 2015 na Câmara dos Deputados, a PEC teve a tramitação prejudicada pelo processo de impeachment (2016), pela intervenção militar no Rio de Janeiro (2017), pelo calendário eleitoral (2018) e, agora, pela prioridade dada na Casa à Reforma da Previdência (2019).
“um novo Fundeb, que deverá ser permanente, ter a capacidade de criar matrículas e universalizar um padrão de qualidade capaz de garantir o processo de ensino-aprendizagem”
Disparidades
Enquanto um município localizado no Rio Grande do Sul destinava cerca de R$ 19,5 mil por aluno em 2015, havia outro município no Maranhão dispondo de apenas R$ 2,9 mil. Essa diferença, de quase sete vezes, é apontada na oitava edição do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2019, publicado pela organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, plural e suprapartidária Todos Pela Educação.
De acordo com esse levantamento, a disparidade se repete entre os estados. Enquanto São Paulo recebe a maior média anual de recursos vinculados à Educação por aluno, R$ 6,5 mil; no extremo oposto está o Maranhão, que dispõe de apenas R$ 3,5 mil por aluno ao ano. O anuário é publicado desde 2014 e é organizado segundo os temas das metas do PNE.
Na avaliação da ong, um dos maiores desafios para avançar na qualidade da Educação é a falta de um conjunto de políticas docentes que atuem na formação, carreira e condições de trabalho dos professores. “Em 2018, o rendimento médio dos docentes da Educação Básica com curso superior (R$ 3.823,00) correspondeu a 69,8% do que ganhavam, em média, outros trabalhadores com mesmo nível de escolaridade (R$ 5.477,05). Em 2012, essa proporção era de 60,8%”, pontua o estudo.
Em relação à formação dos professores, revela a publicação, desde 2012, não há aumento significativo no número de docentes com formação adequada para as disciplinas que lecionam. Isto significa que há aulas de matemática – por exemplo – sendo ministradas por docentes que não têm formação na área. As taxas permanecem preocupantes: em 2018, 48,7% dos docentes dos Anos Finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) tinham formação adequada, um crescimento de 5,1 p.p. em comparação a 2012. Já no Ensino Médio, essa taxa era de 56,3% – um aumento de 5,4 p.p. nos últimos seis anos.