por Cláudia Leitão 05/01/2018
Os anos 1980 serão especialmente importantes para a transfiguração dos significados acerca do desenvolvimento, que deixa de ser considerado como um mero fluxo de formação de capital medido pelo Produto Interno Bruto (PIB) e passa a incorporar novos indicadores relativos à ampliação das liberdades e à qualidade de vida. Em dezembro de 1986, a Organização das Nações Unidas (ONU) produz uma primeira Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, incluindo-o na categoria dos Direitos Humanos.
Em 2005, a Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), aprova a Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, ratificando o esforço dos países na construção de um diálogo intercultural capaz de contribuir para uma cultura de paz entre os povos, considerando a diversidade cultural um patrimônio comum da humanidade e destacando a cultura como elemento estratégico das políticas de desenvolvimento. Nesse sentido, o conceito de sustentabilidade é ampliado, deixando de se limitar a uma qualidade do desenvolvimento para se constituir na sua própria essência.
Dessa forma, os setores culturais/criativos (audiovisual, literatura, música, artes visuais, artes cênicas, moda, design, arquitetura, publicidade, artesanato, gastronomia, festas, games, entre outros) na sua dimensão passam a se tornar cada vez mais importantes na constituição do Produto Interno Bruto (PIB) dos países industrializados, crescendo mesmo em situações de crise. Essa tendência lhes dá prestígio junto aos governos, que buscam compreender e fomentar suas dinâmicas econômicas.
Em 2008, as discussões sobre as dinâmicas econômicas dos bens e serviços culturais/criativos chegam à Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (UNCTAD), por meio do primeiro Relatório Mundial sobre a Economia Criativa, num esforço de aprofundar o conceito e de compilar informações e dados sobre a economia dos bens simbólicos dentro de uma perspectiva mundial. Em 2010, a UNCTAD amplia sua compreensão da economia criativa, indo além da lógica industrial: A economia criativa é um conceito em evolução baseado em ativos criativos que potencialmente geram crescimento e desenvolvimento econômico; ela pode estimular a geração de renda, a criação de empregos e a exportação de ganhos, aos mesmo tempo em que promove inclusão social, diversidade cultural e desenvolvimento humano; é uma opção de desenvolvimento viável que demanda respostas de políticas inovadoras e multidisciplinares, além de ação interministerial.
A partir de 2013, as pesquisas sobre a economia criativa também passam a ser realizadas pela UNESCO. Apesar do esforço de compilação de dados sobre a economia criativa mundial, realizados pelas organizações internacionais nos últimos anos, muitos países continuam “invisíveis” nesses relatórios. As metodologias quantitativas capturam ou mensuram, em sua grande maioria, a produção de riqueza do que é passível de ser mensurado quantitativamente, ou seja, o impacto econômico das indústrias criativas, ignorando a imensa produção formal e informal dos micro e pequenos empreendedores dos setores culturais e criativos, em todo o planeta. Quando o tratamento é de natureza qualitativa, os resultados limitam-se a descrever os cases de sucesso e, neste caso, a pesquisa torna-se um acumulado de experiências criativas que carecem de maior sistematização e interpretação.
Se as pesquisas relativas à economia criativa ainda são insatisfatórias, impossível negar sua importância cada vez mais estratégica no planeta. E, no mundo globalizado, em que dependências científicas e tecnológicas determinam padrões de consumo e de comportamento das populações, o Brasil já poderia ser uma liderança, especialmente junto aos países do Cone Sul, na construção de um novo desenvolvimento. Afinal, a exportação de commodities vem perdendo gradativamente sua importância frente à exportação de bens e serviços de alto valor agregado, cujos insumos são a cultura, a criatividade, a educação e a ciência & tecnologia.
Em tempos eleitorais, esse debate acerca da economia criativa necessita atravessar os programas político-partidários. Para o bem do Brasil.
Cláudia Leitão