O vice-presidente da República e coordenador do Conselho Nacional da Amazônia, Hamilton Mourão, descartou que a agência planejada para a coordenação dos sistemas de monitoramento e vigilância do território nacional venha a ser submetida a um comando militar.
“Estou pensando numa agência independente”, disse ao Valor.
Na semana passada, Mourão havia citado o Escritório Nacional de Reconhecimento (NRA), das Forças Armadas americanas, como exemplo dessa agência.
Segundo ele, a agência coordenaria a demanda de vários órgãos, como ICMBio, Funai, Ibama, Polícia Federal (PF), e a produção de dados e imagens de instituições como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Centro de Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam).
Monitoramento
De acordo com o Valor Econômico, o Inpe é a agência brasileira de monitoramento de dados de satélite mais reconhecida no mundo, mas o vice-presidente disse que faltam ao órgão ferramentas do que chamou de “business intelligence“.
“O ciclo do Prodes terminou em julho, mas só será divulgado em dezembro”, disse Mourão sobre a primeira estimativa das taxas anuais de desmatamento apresentadas pelo projeto de monitoramento da floresta amazônica. O dado consolidado só é apresentado no primeiro semestre do ano seguinte.
Tensão
Desde sua posse, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, têm relações tensas com o Inpe. No ano passado, o questionamento dos dados do instituto levou à demissão do então diretor Ricardo Galvão, que acabaria escolhido pela revista “Nature” como um dos dez cientistas mais importantes do mundo em 2019.
Após a saída de Galvão, o Inpe passou a ser dirigido pelo coronel da Aeronáutica Darcton Damião.
Fogo cruzado
Mourão reconhece a permanência da guerra interna no governo em torno do tema.
“Estou no fogo cruzado entre o Inpe e a Embrapa Territorial”, disse, reconhecendo a ascendência de Evaristo Miranda, diretor do braço de monitoramento da Embrapa, sobre os questionamentos do governo em relação à sistemática de produção e análise de dados do Inpe.
Segundo Mourão, o trabalho poderia ser agilizado se o Inpe dispusesse de “mais TI [tecnologia da informação]“. O problema poderia ser resolvido com mais investimentos no Inpe, mas ele diz que a alternativa não contemplaria a necessidade das Forças Armadas ou da Polícia Federal, que têm demanda de dados sigilosos de mais precisão. Daí a ideia da agência.
“Não estou questionando o Inpe, mas ele produz dados quantitativos, preciso da análise do dado. Quem provoca? É o indígena ou é um grupo de madeireiros? O Inpe não indica as áreas regeneradas nem se a queimada ocorreu no mesmo lugar do ano anterior.”
Comunicação
Relatório da PF indicou quatro fazendas de Mato Grosso onde teriam se originado os incêndios do Pantanal. O vice disse ter tomado conhecimento do relatório “pelos jornais”. “Não temos dúvidas de que determinadas queimadas são feitas por gente que está no terreno, proprietários que usam manejo antiquado. Não acredito que essas pessoas tacaram fogo por necessidade. É incompetência junto com ignorância.”
Em São Paulo, só o endurecimento penal foi capaz de por fim às queimadas. Mourão reconhece os efeitos da legislação paulista, mas diz haver dificuldades para sua adoção em todo o território nacional. “Em outros tempos a região oeste de São Paulo também queimava nesta época do ano. A lei surtiu efeito, mas o Estado tem estrada pra todo lugar e propriedades com titulação. Na Amazônia não tem uma coisa nem outra.”
Queimadas
Mourão vê a regularização fundiária na Amazônia Legal como um passo que antecede o endurecimento penal contra as queimadas.
“Com o título da terra, a pessoa passa a ter acesso a financiamento e assistência técnica rural. Pode melhorar a produtividade e a maneira como trata a terra.”
O vice-presidente disse estar comprometido em recuperar a confiança dos governos alemão e norueguês, que eram os principais financiadores do Fundo Amazônia até esbarrarem em Salles.
“Apresentamos nossa proposta de governança. Eles [alemães e noruegueses] estão esperando resultados melhores para desbloquear os recursos”, disse, acrescentando ter certeza de que os três meses seguidos de redução de desmatamento os garantirão.
Com informações do Valor Econômico