
O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirma ter certeza de que deve ser alvo de inquéritos que teriam como objetivo levá-lo à prisão caso perca as eleições. Ele acredita também que seus filhos podem se tornar alvos mais fáceis de investigadores caso deixe a Presidência da República.
Bolsonaro tem repetido a fala a diversos interlocutores em Brasília, inclusive de seu próprio governo.
Com dificuldade de se recuperar nas pesquisas eleitorais, a hipótese estaria deixando o presidente cada vez mais inquieto e, de acordo com alguns interlocutores, “transtornado” em alguns momentos.
Segundo políticos e autoridades que não integram o governo, mas que conversaram com ele nos últimos dias, Bolsonaro tem dito que reagirá —e que não será preso com facilidade.
De acordo ainda com os mesmos relatos, ele tem demonstrado nervosismo e repetido frases semelhantes à que disse em um discurso no dia 7 de setembro do ano passado, em um ato na avenida Paulista, em São Paulo: “Nunca serei preso”.
Na mesma ocasião, ele afirmou que poderia sair do Palácio “preso, morto ou com vitória”. A primeira hipótese estaria descartada. Nas conversas em Brasília, ele também teria dito, na mesma linha do discurso em São Paulo, que pode haver “morte” caso tentem prendê-lo.
Bolsonaro prefere matar do que ser preso
O transtorno demonstrado por Jair Bolsonaro (PL) diante da possibilidade de ser preso se perder as eleições de outubro já extrapolou os bastidores do governo e assustou apoiadores em uma reação considerada desesperada pelo presidente em conversa no último fim de semana.
Segundo informações de Guilherme Amado, no site Metrópoles, ao ser indagado por um apoiador sobre qual seria sua reação caso a polícia batesse à porta com mandado de prisão, Bolsonaro teria se descontrolado e respondeu de maneira agitada.
“Eu atiro para matar, mas ninguém me leva preso. Prefiro morrer”, respondeu.
A dois meses das eleições presidenciais com as pesquisas de intenção de votos, que mostram vitória de Lula (PT), inalteradas, Bolsonaro desenvolveu uma nova obsessão: o medo de ser preso.
Os próprios ministros confirmam que o medo de Bolsonaro ser preso seria “mera constatação sobre uma suposta perseguição que ele poderia sofrer se perdesse o mandato”.
Inquieto e com medo, Bolsonaro teria se decidido a esgarçar ainda mais a relação com o Judiciário e os movimentos da sociedade que defendem a democracia em meio às incitações golpistas do presidente.
Bolsonaro já mostrava medo de ser preso
Em junho, Bolsonaro já demonstrava medo de ser preso caso não seja reeleito. Durante conversa com jornalistas em Orlando, nos EUA, enquanto saía de uma churrascaria, ele citou o que aconteceu com a ex-presidente da Bolívia, Jeanine Añez.
Jeanine foi condenada à prisão por tramar um golpe de Estado, em 2019.
“A turma dela perdeu, voltou a turma do Evo Morales. O que aconteceu um ano atrás? Ela foi presa preventivamente. E agora foram confirmados 10 anos de cadeia para ela. Qual a acusação? Atos antidemocráticos. Alguém faz alguma correlação com Alexandre de Moraes e os inquéritos por atos antidemocráticos? Ou seja, é uma ameaça para mim quando deixar o governo?”, disse Jair Bolsonaro, na ocasião.
Bolsonaro sugeriu ainda que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que investiga a rede bolsonarista de distribuição de notícias falsas e de financiamento de ataques à democracia, seria um psicopata.
O ministro é alvo constante do presidente e apoiadores, principalmente por determinar decisões contrárias a bolsonaristas, a exemplo de Daniel Silveira e Roberto Jefferson.
“Isso nunca ocorreu no Brasil. Uma pessoa apenas decide. Ele faz um inquérito, que não tem a participação do Ministério Público, e investiga por fake news. O que esse cara tem na cabeça? O que é que ele está ganhando com isso? Quais são seus interesses? Ele está ligado a quem? Ou é um psicopata? Ele tem um problema”, disse Bolsonaro.
Bolsonaro cita os atos antidemocráticos, alvos de uma investigação em trâmite no STF que está nas mãos da pessoa na República que o presidente mais teme, o ministro Alexandre de Moraes. E aproveitou a fala em Orlando para cacetar novamente ministros do STF e do TSE. Mas ele sabe que uma ação decorrente disso não seria a única que teria que enfrentar ao deixar o cargo. Daí, o medo de deixá-lo.
Há também acusações de desvios de recursos de seu gabinete quando parlamentar (as chamadas “rachadinhas”), de sabotagem ao combate à covid-19 que aumentou significativamente o número de mortos, de ataques às instituições e ao regime democrático ou de qualquer um dos casos de superfaturamento ou pedidos de propina que pipocaram em seu governo.
No dia 27 de abril, a ex-presidente da Bolívia já havia aparecido em um discurso de Bolsonaro no Palácio do Planalto.
“Tenham certeza eu jamais serei uma Jeanine, jamais, porque primeiro eu acredito em Deus e depois acredito em cada um de vocês que estão aqui. A nossa liberdade não tem preço, digo mais, como sempre tenho dito: ela é mais importante que a nossa própria vida, porque um homem, uma mulher sem liberdade não tem vida”, disse Bolsonaro.
O que pode acontecer com Bolsonaro?
Como presidente, Bolsonaro só pode ser processado por crimes relacionados ao mandato. Mas, para isso, deve ser denunciado pelo procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras. O que é praticamente impossível de acontecer dada a conduta adotada pelo PGR até o momento de ignorar deliberadamente todas as condutas criminosas de Bolsonaro desde que assumiu o poder.
Depois, na remota hipótese de um processo aberto pelo PGR, precisaria do aval da Câmara dos Deputados para ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A Câmara é presidida por Arthur Lira (PP-AL), importante liderança do centrão, que dominou o governo Bolsonaro, e é um aliado de primeira hora do atual ocupante do Planalto.
Nada foi feito por nenhum dos dois após a conduta criminosa de Bolsonaro diante dos embaixadores, que poderiam levar ao seu impeachment.
Mas, sem foro privilegiado, procuradores e promotores em todo o país podem mover ações contra Bolsonaro na justiça comum, o que aumenta as chances de punição.
De acordo com a Folha, são dez processos na esfera civil, onde não há foro, por danos morais e por condutas relacionadas à pandemia em que Bolsonaro foi alvo direto no decorrer do mandato, identificados a partir de ferramenta da empresa Digesto para consulta de processos públicos tribunais em primeira instância.
Foram duas condenações por danos morais – uma na ação do Sindicato do Jornalistas do Estado de São Paulo por ataques reiterados contra profissionais, julgada em primeira instância, e dos ataques de cunho sexual feitos contra Patrícia Campos Mello, a repórter da Folha, com condenação em segunda instância.
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Também foram identificados 8 processos relacionados ao descumprimento das medidas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no combate à pandemia que não deram em nada.
Bolsonaro também foi alvo de pedidos de liminares por conta das motociatas realizadas em 2021, além do pronunciamento em rede nacional em que afirmou que a covid-19 não passava de uma “gripezinha”. Essas ações também não foram para frente e foram negadas.