A posse de Joe Biden para a presidência dos Estados Unidos da América (EUA) completou, na última quarta-feira (28), 100 dias. As mudanças na política adotada pelo governo estadunidense em relação ao antecessor, o republicano Donald Trump, são profundas.
A nova linha ideológica adotada pelo democrata tem sido apontada como principal motivação para as mudanças de tom no discurso adotadas na política internacional de Jair Bolsonaro (sem partido), um dos últimos líderes a reconhecer a vitória do democrata.
A Casa Branca modificou a postura em relação ao enfrentamento à pandemia da Covid 19 e à política ambiental e de direitos humanos. Também mudou as relações internacionais, ainda que o novo presidente, mesmo adotando uma postura de grande velocidade para recuperar as relações diplomáticas americanas, mantenha posturas semelhantes às de Trump em vários setores.
Política internacional de Biden
O presidente dos EUA, apesar de ter trabalhado nos primeiros 100 dias de seu governo para reestabelecer relações diplomáticas, apresentou uma tímida mudança de postura frente a países como China e Rússia.
Em relação ao país asiático, Biden abriu a disponibilidade de trabalho conjunto em pontos de concordância sobre a questão ambiental. O presidente também destravou os trabalhos na Organização Mundial do Comércio (OMC), prejudicados devido à batalha comercial travada por Trump contra a China em seu mandato, porém outras posturas importantes do governo estadunidense em relação à China foram mantidas.
A pressão do governo dos EUA sobre a comunidade internacional para a construção de uma espécie de front contra a China, utilizando as pautas democráticas e de direitos humanos para pressionar o país asiático, é apontada por especialistas como um sinal de que a postura do governo americano na política internacional é ainda significativamente mantida. Da mesma forma em que pressiona a China, Biden sinaliza não querer retirar, ao menos por enquanto, sanções impostas sobre a Rússia.
Mesmo criticada, a postura de Joe Biden também isolou o Brasil em relação à comunidade internacional. Desde antes do início do mandato de Bolsonaro o discurso do presidente e de aliados em relação à China, por exemplo, tem sido responsável por um desgaste diplomático importante com o país, que é aliado econômico histórico do Brasil.
Em novembro do ano passado, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) chegou a acusar a China de espionagem ao comentar pelas redes sociais sobre a adesão do Brasil à chamada Clean Network (Rede Limpa), articulada pelos Estados Unidos e cujo objetivo é banir a empresa de telecomunicações Huawei dos serviços de tecnologia 5G.
Agora, o Palácio do Planalto, após perder um de seus únicos pontos de apoio na comunidade internacional, procura uma diplomacia menos ideológica. Modificando sua política externa, o governo optou pela saída de Ernesto Araújo do Ministério das Relações Exteriores. A mudança no Itamaraty seria relacionada à busca do Executivo Federal por uma imagem mais pragmática para a diplomacia brasileira.
Pandemia da Covid-19
Já no enfrentamento à pandemia, nos primeiros 100 dias do novo governo dos EUA, o presidente democrata sinalizou uma mudança expressiva na política interna contra a transmissão do coronavírus. A Casa Branca retornou à Organização Mundial de Saúde (OMS), voltou a pagar suas contribuições para a entidade.
O governo dos EUA também destinou recursos para a compra de vacinas pela Covax, programa criado pela OMS junto a organizações filantrópicas para ampliar a distribuição de imunizantes e garantir que nações de baixa renda não sejam negligenciadas.
Mesmo assim, Biden tem sido criticado internacionalmente pela concentração de doses de imunizantes contra a Covid-19 dentro do território americano em detrimento de países mais pobres. O diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus, chegou a definir a concentração de vacinas como um “escândalo moral”.
Apesar das críticas, a mudança de postura de Biden isolou o governo Brasileiro na relação conturbada com a OMS que pautou o discurso adotado por Bolsonaro desde o início da pandemia, em consonância com o adotado por Donald Trump.
O Palácio do Planalto demonstrou recentemente uma significativa mudança de postura. O novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, desde março busca o apoio da OMS. Em abril, pela primeira vez, houve uma reunião entre o chanceler brasileiro Carlos França e o diretor-geral da agência.
Avanços no meio ambiente de Biden
A convocação da Cúpula de Líderes em relação ao clima, ocorrida no dia 22 de Abril, marcou uma mudança de postura de Biden em relação às questões ambientais. O presidente democrata anunciou metas para a redução de emissões de gases de efeito estufa e fez questão de colocar o tema no centro de sua agenda para 2021.
Diante dos avanços de Biden na pauta, o governo brasileiro modificou seu discurso, anteriormente alinhado com o de Trump na recusa em firmar acordos internacionais sobre as questões climáticas. A fala de Bolsonaro na Cúpula de Líderes demonstrou mudanças ao diminuir os ataques a outros países na questão ambiental, porém foi duramente criticada por organizações ambientais brasileiras.
O governo teria manipulado dados e transferido a responsabilidade pela redução do desmatamento à falta de recursos e não às políticas de desmonte das instituições ambientais nacionais, segundo carta divulgada na última quarta-feira (27) por sete entidades relacionadas ao clima.
Direitos Humanos
No início de seu mandato, Joe Biden anunciou para a OMS o fim da postura adotada por Trump de vetar termos como saúde reprodutiva e direitos sexuais em programas e resoluções internacionais. Os termos vetados, segundo o que defendiam Trump, Bolsonaro e Viktor Obran (primeiro-ministro da Hungria), abriam brechas para a legitimação do aborto.
Essa linha de ação, resguardada por uma aliança política de base ultraconservadora e religiosa do ex-presidente dos Estados Unidos com Bolsonaro, possibilitou ao Brasil, representado por Bolsonaro, a demarcar uma postura controversa em relação a votações em decisões da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre direitos das mulheres, acesso à educação sexual, direitos reprodutivos, movimento LGBTQIA+ e temas como racismo, violência policial, minorias e democracia.
Em reunião da ONU ocorrida em Julho de 2019, o Brasil acompanhou mais de uma vez países islâmicos em votações sobre direitos das mulheres e sexuais na tentativa de suprimir termos que sinalizavam a ampliação da educação sexual em tratados internacionais.
Com informações do Uol