O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criou um novo critério para a liberação de emendas. De acordo com reportagem da Revista Crusoé, R$ 660 milhões em recursos do caixa federal já foram liberados para obras e projetos indicados por sete parlamentares que ocupam vagas na CPI da Pandemia no Senado, como titulares ou suplentes.
A reportagem mostra que um sexto do total liberado tem origem em emendas individuais e de bancada e foi pago a partir da última semana de abril, quando a CPI iniciou oficialmente os trabalhos. O restante está vindo do chamado orçamento paralelo, que o governo deverá explicar como funciona ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Leia também: CPI anuncia 14 investigados e vota requerimentos
O detalhe é que os pagamentos ocorrem com maior frequência para os senadores que defendem Bolsonaro na CPI, na expectativa de blindar o presidente da República das ameaças de impeachment, segundo a publicação. O dinheiro tem saído, em maior medida, dos ministérios do Turismo, da Agricultura, da Infraestrutura e do Desenvolvimento Regional.
Liberação de verbas é estratégia eleitoral
Para o deputado federal Camilo Capiberibe (PSB-AP), a liberação de emendas a aliados demonstra que o governo assumiu a sua principal estratégia para chegar às eleições 2022, paralisando as ameaças que podem surgir na Câmara e distante do discurso anticorrupção que levou Bolsonaro à Presidência.
“É o governo no qual o conceito do ‘toma lá da cá’ foi levado ao extremo para perpetuar no poder a necropolítica de Bolsonaro. O projeto pessoal, totalitário, perverso de Bolsonaro, contra seu próprio povo, é pago com o dinheiro que falta para as vacinas e para colocar comida no prato daquela enorme parcela que está cada dia mais empobrecida.”
Camilo Capiberibe
O parlamentar destaca que o projeto em curso no Congresso Nacional simboliza o desmonte do Estado brasileiro. “Ao preço das riquezas de todo o povo brasileiro. Os interesses da Nação e do nosso povo são desconsiderados. Direitos da população estão sendo tirados sem qualquer pudor; estatais privatizadas a preço vil. E o negacionismo de Bolsonaro e seu governo em todos as áreas que levam ao genocídio do povo brasileiro, especialmente os povos originários”, analisa Capiberibe.
Redutos eleitorais de aliados na CPI
A reportagem da Crusoé revela exemplos dos repasses a aliados, como os destinados aos municípios de Ji-Paraná, em Rondônia, e Petrolina, em Pernambuco. As emendas para os dois municípios não estavam nem sequer entre as prioridades estabelecidas pelas bancadas dos dois estados, mas por determinação do Palácio do Planalto passaram à frente da fila nos meses de maio e junho, quando a CPI já estava em curso.
Leia também: Omar Aziz pede condução coercitiva de Carlos Wizard à CPI
Na CPI, discurso moralista; na prática, ‘tropa do cheque‘
Petrolina, em Pernambuco, é reduto eleitoral de Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado e também integrante da comissão. Ao todo, ele aparece como o responsável por indicar o destino de R$ 153,8 milhões.
Ji-Paraná, em Rondônia, é cidade-natal e berço político do senador Marcos Rogério (DEM/RO), o cabeça da tropa de choque governista na CPI, relator do projeto de privatização da Eletrobras no Senado. Ele foi agraciado com a liberação de 127 milhões de reais em verbas.
Desse valor, R$ 22,9 milhões foram liberados no último dia 2 de junho para a construção de uma passarela sobre uma rodovia federal que corta Ji-Paraná. A manobra do Planalto para beneficiar o aliado fica clara. Ao definir para onde deveriam seguir os recursos das emendas de bancada, os parlamentares federais de Rondônia apresentaram, no orçamento deste ano, um total de 20 propostas. A única que foi atendida até o momento foi justamente a que interessa a Marcos Rogério.
Ji-Paraná tornou-se um polo de investimentos federais, diz a reportagem. Com 130 mil habitantes, já foi contemplada com um total de 33 milhões de reais. A cifra supera até a da capital do estado, Porto Velho, que tem uma população quase cinco vezes maior e para onde foram destinados, até o momento, 14 milhões. Enquanto dá a cara à tapa na CPI como advogado do governo, localmente Marcos Rogério se vangloria dos recursos que tem conseguido destinar para a sua região.
Engenharia especial para liberar verbas de aliados
Entre os outros senadores da CPI que receberam fatias do orçamento estão o piauiense Ciro Nogueira (PP-PI) e o gaúcho Luiz Carlos Heinze (PP-RS), e o catarinense Jorginho Mello (PL-SC). Um dos mais destacados chefes do Centrão, Ciro já foi contemplado com R$ 135 milhões.
Conforme explica a reportagem, a engenharia da liberação de recursos para os aliados do governo na CPI é especial. Os repasses não precisam nem do aval da Secretaria de Governo, como costuma acontecer normalmente.
A orientação do próprio Bolsonaro é para que os ministérios encarregados de liberar as verbas priorizem as demandas dos aliados do governo que integram a comissão. Com frequência, os ministros das pastas aparecem ao lado dos senadores em eventos nos quais são anunciados os projetos e as obras a serem executados com as verbas oriundas da parceria estratégica.
Com informações da Crusoé