Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alertou para o iminente risco de retrocesso democrático no país e afirmou que há chance de uma ruptura institucional no Brasil. Sob ameaça de sofrer a primeira derrota para o Centrão desde que sucedeu Eduardo Cunha (2015-2016) na presidência da Câmara, Maia encerra nesta segunda-feira (1º) quatro anos, seis meses e 19 dias de comando da Casa.
“Houve e há uma chance de ruptura institucional. A eleição da Câmara é um divisor de águas nesse assunto. Acho que o presidente da Câmara precisa ser alguém que não seja dependente do governo e que não deva sua eleição ao presidente da República. Com isso, o presidente [Jair Bolsonaro] se sentirá forte o suficiente para ampliar o conflito com as instituições democráticas, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal”, disse Maia ao jornal.
Pedidos de impeachment engavetados
Depois de cumprir um mandato-tampão e dois completos – consecutivo, o que o tornou o mais longevo presidente da Câmara de forma ininterrupta desde Ranieri Mazzilli (1958-1965), o deputado encerrará sua gestão com o estigma de ter ignorado os mais de 60 pedidos de impeachment contra Jair Bolsonaro (sem partido).
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Durante o período em que comandou a Câmara, Maia conteve o andamento da chamada “agenda de costumes” defendida pelos aliados do presidente, distribuiu uma profusão de notas de repúdio contra assanhos antidemocráticos do mandatário, mas capitaneou ações na área econômica que agradaram ao mercado, como a reforma da Previdência, ou deram impulso à popularidade do presidente, como o auxílio emergencial de R$ 600 durante a pandemia.
A mudança de postura de Maia
Em quase todo esse período, Maia atuou como fator de estabilidade e apoio aos presidentes da República. Foi essencial para que Michel Temer (2016-2018), do MDB, resistisse no cargo durante o escândalo da JBS, em 2017, ocasião em que o presidente foi acusado, entre outras coisas, de compactuar com a compra do silêncio de Cunha, já na cadeia àquela altura.
Temer escapou de ser afastado por duas vezes graças ao plenário da Câmara, que não reuniu os 342 votos necessários para aceitação de denúncia criminal contra ele.
Já durante o mandato de Bolsonaro, Maia refutou apelos relacionados ao risco de real abalo à democracia. Em meados do ano passado, por exemplo, quando o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) afirmou que não era questão de “se”, mas de “quando” haveria a ruptura, quando bolsonaristas fantasiados ao estilo de grupos supremacistas soltaram fogos de artifício em direção ao STF e quando o próprio presidente insuflou uma manifestação golpista em frente ao QG do Exército, Maia divulgou nota dizendo que não via ameaça de ruptura institucional nem apoio nas Forças Armadas para aventuras antidemocráticas.
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Semanas depois, citou pesquisa do Datafolha mostrando ser de 75% o apoio da população à democracia para dizer que “o brasileiro não permitirá um retrocesso institucional”.
Sobre as críticas de que deveria ter dado aval à deflagração do impeachment de Bolsonaro, Maia afirma que fazer isso durante a pandemia atrapalharia o combate ao vírus, além de poder fortalecer o presidente. Em sua visão, não há ainda força suficiente nas ruas e no Congresso para destituir Bolsonaro. “Hoje tenho a clareza de que, do ponto de vista da prioridade, eu não errei”, afirmou.
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Além do fim do mandato de Maia, a segunda-feira (1º) será marcada pela eleição dos novos presidentes da Câmara e do Senado. A disputa entre Arthur Lira (PP-AL), candidato de Bolsonaro, e Baleia Rossi (MDB-SP), indicado por Maia, será decisiva na agenda política do Brasil para os próximos dois anos.
Com informações da Folha de S.Paulo