
Mais um escândalo abala o governo de Jair Bolsonaro (PL). Dessa vez, foi revelado que o líder do governo do presidente no Congresso, senador Eduardo Gomes (PL), fez pedidos de depósitos bancários a um empresário em troca de “ajudar a adiar” uma portaria do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro). Os pedidos do parlamentar estão em mensagens obtidas pela Polícia Federal (PF) e divulgadas pelo jornal O Globo.
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Os diálogos de Gomes foram encontrados pela PF no celular de um amigo do parlamentar, o empresário Jorge Rodrigues Alves, que foi alvo da Operação Lavanderia e atua nos setores de construção civil e iluminação. A ação policial foi deflagrada para investigar um suposto esquema de lavagem de dinheiro e fraudes em licitações no Tocantins.
O líder do governo nega irregularidades e diz que as mensagens se tratam de ‘um pedido de empréstimo’.
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Além das mensagens, a PF também encontrou comprovantes de depósitos a pessoas indicadas pelo senador. Com os indícios em mãos, a polícia encaminhou um relatório sigiloso para a 4ª Vara Federal do Tocantins no último dia 11 de julho, solicitando o envio do caso para o Supremo Tribunal Federal (STF).
“Há, por fim, diversas conversas entre Jorge e o senador Eduardo Gomes, indicando que Jorge aparentemente paga contas para o senador e lhe envia dinheiro, assim como lhe pede favores e intercessão em assuntos de suas empresas”, diz um trecho do documento, que pede que o caso vá para o STF por questões de foro privilegiado de Gomes.
Os depósitos, segundo o documento, ocorrem desde 2016 em contas ligadas ao senador e somam cerca de 760 mil reais. Em uma delas, o parlamentar questiona ao empresário se ele “acha que consegue 20?” ao indicar os dados bancários do seu assessor João Bosco Pinto da Silva. Alves então responde com um ‘Opa! Certeza!’.
O assessor alega não se lembrar do episódio específico, mas disse ser possível, já que empresta a conta constantemente para o senador.
Naquele mesmo ano, em outra conversa, é possível ver uma espécie de prestação de contas de Alves ao para Gomes. O senador pergunta o que já foi feito e o empresário responde com comprovantes de depósitos em cinco contas ligadas ao líder do governo de Bolsonaro. O total dos valores ultrapassa os 42 mil.
Amigos (corruptos) de Bolsonaro
Ainda de acordo com o relatório, Alves teria pago, inclusive, contas do senador. Na véspera de Gomes assumir seu mandato no Congresso, ele pediu que o empresário custeasse o buffet da sua festa, lhe encaminhando a conta de uma mulher. Alves fez o pagamento: “Estamos juntos, amigo”, escreveu o empresário.
O jornal procurou a mulher mencionada na mensagem, mas ela não quis falar sobre o assunto e passou o telefone para outra pessoa, identificada como seu marido. O homem, que não quis dizer o nome, mas afirmou que o pagamento serviu para custear as bebidas da festa de posse do senador e disse que ‘vários amigos se juntaram para ajudar a bancar o evento’.
Outro diálogo indica que, ainda durante a campanha em 2018, Gomes também pediu pagamentos para bancar despesas com veículos e alimentação.
“Tenho que passar 70 mil para uma locadora que pode dar nota que cuida de todos os veículos que estão na campanha”, pediu o parlamentar dois meses antes das eleições. Alves apenas questionou se o pagamento precisaria ser feito naquele dia. Em seguida, o empresário recebe a solicitação de mais dinheiro para alimentação naquela semana. “Eu preciso de 30 para comer até domingo”, escreveu o líder de Bolsonaro. “Uai, tá comendo muiiiito amigo rs”, ironizou o empresário.
“Há elementos para se acreditar que parte dos valores movimentados pelo grupo possa ter ido para o referido senador, por meio de Jorge Rodrigues Alves, como forma de manutenção de uma boa relação, assim como para o financiamento de campanhas políticas”, conclui a PF.
Após todos os pagamentos, em 2019, o empresário pediu que Gomes ‘intercedesse por ele’ no Inmetro, ao que o senador assentiu.
“Preciso muiiiiito de sua ajuda”, escreveu o empresário. “É só falar aonde”, respondeu o parlamentar. “Portaria 20 do Inmetro. Precisa ser URGENTEMENTE suspensa ou adiada”, afirmou Alves. “Vou pedir assim que sair da presidência […]. Falo direto com o Carlos”, disse Gomes, referindo-se a Carlos da Costa, então secretário de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia. “Importantíssimo! Amigo, cuida de mim!”, finaliza Alves.
Dias depois, o senador, que ainda era vice-líder do governo na ocasião, chegou a dizer que poderia trabalhar pela demissão da então presidente do Inmetro, Angela Flôres Furtado, caso o órgão não atendesse ao pedido dele. “Vou ler aqui e montar uma estratégia. Em último caso, a gente questiona via comissão de Infraestrutura. Se houver motivação de espírito público a gente até derruba essa mulher.”
Em mensagens trocadas no dia 26 de junho daquele ano, Gomes encaminhou a Alves o ‘comprovante’ da sua ação: um e-mail em que a presidente do Inmetro informava ao seu gabinete que a vigência da portaria seria adiada em três meses. Uma reunião entre o senador e a Angela Furtado está publicamente registrada no dia seguinte. As novas regras foram, de fato, postergadas e só passaram a valer em novembro de 2019.
Respostas
Ao jornal, Gomes admitiu ser amigo do empresário ‘há 25 anos’, mas negou ter praticado crimes ou irregularidades. Em nota, o parlamentar afirmou que jJamais houve qualquer pagamento ou repasse ao senador Eduardo Gomes nos casos questionados. As mensagens trocadas são autoexplicativas: tratam-se de pedidos de empréstimos a um amigo, mas que não se efetivaram”.
O senador de Bolsonaro disse ainda que não se licenciou por causa das investigações, mas sim ‘para cuidar da base’ no estado e garantiu que retornará ao Senado logo após o término da licença.
Ainda ao jornal, Jorge Rodrigues Alves disse, em nota, que não comenta investigações que correm sob sigilo. Carlos da Costa não quis se pronunciar. O Ministério da Economia disse não ter conhecimento do assunto e orientou que fosse consultado o Inmetro.
O órgão, em nota, afirmou que a vigência da portaria foi adiada porque o órgão ‘constatou que não havia luminárias com certificação dentro dos parâmetros estabelecidos’. Angela Flôres Furtado, ex-presidente do órgão, esclareceu que as ‘decisões tomadas foram baseadas em critérios técnicos’ e negou que houve qualquer pressão por parte do senador.
Com informações da Agência O Globo